Eu comecei a praticar e estudar yoga bem cedo, por volta dos meus dezesseis anos, num momento que ainda vivia coisas que experimentamos mais intensamente na adolescência. Convivemos com diversos colegas dentro e fora da escola e começamos a nos deparar com inúmeras situações que são e continuarão sendo comuns no nosso cotidiano, mas que nesse momento são novas pra gente. Estamos transitando ali da infância para a idade adulta
Essa fase é importante na construção da nossa personalidade. A busca e edificação de uma autoafirmação – uma noção mais consciente sobre quem somos e nossas particularidades – é algo necessário nesta etapa da vida, claro que isso continua por toda a existência, mas aqui esse processo inicia e como isso acontece terá um bom impacto no futuro. Fiquemos tranquilos se para nós essa história não aconteceu da melhor forma, de fato nossa cultura não favorece um caminho de autoconhecimento e muitas vezes esse aspecto fica solto para a maioria de nós. Mas nunca será tarde para começar a colher os caquinhos e reconstituir nosso cercadinho de forma adequada.
Nossos pais, familiares, professores, entre outros cumprem um papel de nos auxiliar nesta direção, bem ou mal. Mas é no dia-a-dia que os momentos vão aparecendo, e os conteúdos internos aflorando. A partir daí vamos nos conhecendo, percebendo nossa forma ímpar de nos vincularmos ao mundo e se tivermos sabedoria, sorte ou uma boa orientação poderemos estruturar algo realmente sólido, que nos concederá uma chegada mais saudável e consciente na exigente vida madura.
Muitas das nossas experiências nesta época podem conferir marcas valiosas para nossas vidas e algumas acontecem de formas totalmente espontâneas e inesperadas. É sobre uma destas preciosas lembranças que venho a recordar neste instante.
A prática formal de yoga começava a me trazer muitos benefícios, sentia-me mais atento, confiante, novas habilidades estavam sendo semeadas e se desenvolviam dentro de mim, e estas se faziam visíveis expressivamente. Estes e outros são resultados muito positivos das práticas de āsanas, prānāyāmas e meditação.
Porém algumas vezes a imaturidade sobrepujava essa busca e usava de tais aptidões originais para me destacar, ocasionalmente causando dano a alguém sem perceber. Numa destas um querido amigo de longa data acabou sendo alvo deste meu orgulho. Humilde e pacientemente ele baixou a cabeça e calou-se, só para que respeitosamente em um momento mais íntimo pudesse me dizer ”amigo, Iago, acredito que não está indo por um bom caminho”. Aquilo me tocou profundamente, chorei muito, arrependido. E desta mensagem dura e amorosa que recebi do meu amigo apelidado Moita tirei reflexões muito estimadas, as quais sou imensamente agradecido. Até hoje procuro fortalecê-las e repassá-las a quem queira através do conhecimento tradicional do yoga.
Em nossas vidas vamos errar, é natural, pois temos muita inconsciência, devemos aprender a nos perdoar e a nos compadecer dos demais errantes também. Se seguirmos um caminho, na direção de reduzir e gradualmente dissolver nossa ignorância e adquirir sabedoria, pouco a pouco vamos diminuindo os danos que causamos e quem sabe ainda auxiliamos os demais!
Toda qualidade ganha que nos favoreça, deve também em oportuna ocasião servir ao próximo. É de nossa responsabilidade guiar nossos dons e conhecimentos de forma que nutra os demais, que ajude; isso é amor. O amor ao próximo é o melhor combustível para o nosso caminho e é também a maior recompensa. Quando realizamos esforços para cumprir com nossas funções e seguimos adiante rumo a sabedoria e libertação de nossos sofrimentos, que seja também pelos irmãos, pela humanidade, pela natureza. Isso chamamos de dharma.
Valeu Moita por me ajudar a começar a entender o dharma tão cedo. Como dizíamos antigamente; ”vivendo juntos, lutando juntos e morrendo juntos”.
lokaḥ samastāḥ sukhino bhavantu
Que todos os seres sejam felizes!
लोकः समस्ताः सुखिनो भवन्तु