Quando Rudá se deu conta, estava caído ao lado de fileiras bélicas bem organizadas, alguns membros carregavam bandeiras em mastros e eram visíveis as feições seguras, carregadas de um certo ar de superioridade nos rostos destes. Na rua, um alvoroço, não dava para ter certeza se o povo ali vinha de encontro com a fileira militante ou se pelejavam entre si de forma aleatória. Em algum momento lhe pareceu até justificável àqueles ali ao lado estarem buscando ordem, ainda que lhe estranhasse o gozo sutil que esbanjavam os indivíduos enquanto observavam a situação caótica a partir de um lugar um pouco mais confortável. Rudá ainda estava sentado, examinando a cena para entender o que se passava. Eis que estranhou a cor que pintava o dia, olhou para cima, o céu pegava fogo, grandes bolas flamígeras choviam, mas não chegavam ao chão. Haviam nuvens pretas de fumaça e chamas para todos os lados; o que dava esse aspecto sombrio e avermelhado em toda a paisagem. Mais estranho que isso foi ver criaturas com aparência humanoide, horrendamente deformadas, voando montadas em pedras cheias de crateras com aspecto queimado. Estes seres estavam raivosos, atacando alvos que da percepção d’ele eram incertos.
Levantou-se Rudá em tal cenário destemperado e passou a caminhar buscando entender a situação. Encontrou entes queridos seus, assustados, os quais decidiu acompanhar pelo anelo sincero de ajudar. Enquanto caminhavam, eram audíveis discursos muito compreensíveis, que justificavam em algum grau toda a batalha que se via ao redor. Ainda sentia-se perplexo perante o vivenciado, algo parecia-lhe fora de lugar. Enquanto andava junto a um irmão seu pelas ruas tumultuadas, tiveram a oportunidade de ver algo revelador. Havia um homem furioso que esbravejava suas ideias ao vento, sua dor era tão intensa que sua pele começava a secar e a mudar de cor, como se apodrecesse. Sua reatividade era tão intensamente impelida pela ira em seus pensamentos, que chifres nasceram em sua fronte. Seu medo era tão evidente, que seu corpo tremia formando cascos nas juntas. Quando este os fitou, sem mais nem menos quis lhes agredir, apenas pelo fato de estarem cortando seu caminho sem exaltar os mesmos ideais. Para Rudá o tempo parou, pois ali reconheceu que o quadro era formado pelo que existia dentro de nós. Eram sim muito justas boa parte das demandas levantadas por diversos dos grupos que encontrou no percurso, porém, havia algo mais. A forma como estavam se relacionando com a realidade criava um pandemônio absurdo. E todos sem exceção sofriam, de uma forma ou de outra.
Seu irmão hesitou preocupado enquanto o homem avançava. Rudá, com tais reflexões em mente, como num abraço carinhoso, porém firme, puxou o varão ao chão e o conteve ali. Explicou ao que lhe era caro, levando a esperança de também tocar ao homem, que o mal era ignorância, e estava dentro de nós e que seria necessária uma transformação intima profunda se realmente quiséssemos mudanças reais em nosso mundo. Ao mesmo tempo que falava, ele percebia que aquilo era um sonho auto criado. Ao olhar para fora como a si mesmo pode se enxergar e então foi envolto por uma luz que lhe deu a capacidade de voar e sair dali. O homem endiabrado incinerou-se e virou poeira cósmica, como símbolo da transformação interior de Rudá, que logo se lançou aos céus, liberado para partir à um lugar melhor. Mas ao olhar para baixo, seu irmão não havia compreendido suas palavras e corria enredado em suas próprias perturbações. Ele não pôde deixar de considerar seu amado familiar e tampouco as pessoas que ali lutavam por um mundo melhor. Portanto voltou. Dentro dele compreendendo que a realidade ali percebida era um véu que cobria a verdadeira natureza e que desviava do propósito humano fundamental. Mas entendendo também que mesmo um sonho como este, com suas tramas e dramas, tem seu papel.
Ficou. Dedicado em ajudar toda alma que sofre, independente das vestiduras de cada um naquela existência fictícia. Pois em realidade todos são iguais naquilo que nos une e o alvo essencial é comum aos seres. Assim Rudá seguiu até o último momento, em meio ao mundo, mas agarrado ao que é invisível e mais profundo. Sua missão era; com amor e sabedoria, dirigir-se e levar o máximo de pessoas junto a si para a luz que existe atrás do véu.
Desse modo esperamos que Rudá e outros como ele sejam bem sucedidos, e que cada um floresça em si mesmo, para que todos os seres encontrem a paz e sejam felizes.