Esse texto é uma parte de uma carta anônima escrita a mão, que foi encontrada e trazida de um futuro não tão distante.
’’…Quando me dei conta estava em um futuro não muito distante, mas com certeza distinto do presente que estava acostumado… Duas pessoas próximas a mim pegaram o elevador da direita na minha frente, os segui chamando o da esquerda. Antes de chegar no andar que tínhamos como alvo, a energia acabou e tive que terminar a subida escalando pelos cabos. De fato o que escutei na viagem no tempo, até esse momento à frente, era verdadeiro; a eletricidade estava acabando de vez. Percebi que meus queridos tinham se esgueirado por passagens estreitas em busca de algo neste prédio. Segui seus rastros audíveis e os encontrei encolhidos em uma sala de estar com controles nas mãos.
-O que estão fazendo?- Perguntei assombrado. -Estamos procurando resquícios de energia elétrica para assistir alguma coisa- me responderam. Contestei que precisávamos procurar nossas companheiras, afinal, o mundo colapsava. Não os julguei por não me darem atenção, era perceptível sua agonia. E a busca por um momento final de estímulo digital prazeroso lhes arrebatava intensamente. Talvez na tentativa de apagar o temor pelo desconhecido que estava por vir ou apenas porque o hábito era muito forte.
Os respeitei, mas me dirigi para fora do prédio no intento de encontrar minha amada. Sem celular funcionando, sem telefone e em um lugar desconhecido, reconheci a dependência que tínhamos criado nessas ferramentas. Se eu tivesse vivido mais presente, desenvolvido mais minhas faculdades internas, poderia encontrá-la; através do rastreamento, da intuição, da telepatia. Se alguém chegar a ler isso, pode até duvidar de mim e achar que isso é coisa de maluco, mas foi o que senti. E por ter feito ao menos algum esforço nessa direção interior, sabia que isso seria possível. Mas ali estava, perante um mundo onde não havia mais o digital e tudo que tinha sido criado virtualmente desaparecera. Observando a rua havia caos, sofrimento e até alguma destruição… A eletricidade acabou, o mundo virtual desapareceu e as pessoas estavam sucumbindo junto.
Para mim ficou evidente que o reino digital era contrário ao reino interior. Construído a base de estímulos rápidos e intensos nos moveu para uma dimensão de experiência humana mais densa, mais acelerada do que já tinha sido conhecido. Indubitavelmente agravamos nossa debilidade. E agora? É como se o mundo real não tivesse vida, porque o reino de dentro ficou de lado. Olho minhas mãos e me questiono se ainda existo. A sensação é de morte espiritual…
Acho que agora que as falsas cores da dimensão tecnológica se dissiparam junto com a eletricidade percebo melhor o que o mestre dos mestres dizia sobre o reino dos céus, o reino de Deus. Uma vida que nasce e cresce dentro da gente e que nos faz reconhecer a partir do íntimo toda a vida que existe. Construir concentradamente para dentro e para cima era o que eu deveria ter feito e o que deveremos fazer a partir de agora. Reaprender a viver… Dar vida ao próprio Ser. Esse é o verdadeiro caminho.
Sábios aqueles que estão criando consciência desde os tempos passados, inteligentes aqueles que aprenderam a viver em harmonia com a natureza desde lá de trás. E que estes que não o fizeram, entendam e aproveitem o tempo que têm. Se eu pudesse desejar algo, seria que pudéssemos despertar e que não soframos muito…’’
Ao ler essa carta, que de alguma forma chegou ao nosso tempo, reflito sobre a nossa relação com o meio digital e com o nosso mundo interno. Considero analisar com mais seriedade o que de fato estamos nutrindo e para onde estamos indo.
Achei que seria válido compartilhar essa carta que encontrei com todos, como trouxe importantes reflexões para mim, também pensei que poderia servir para alguém aí. Se por acaso eu encontrar mais informações interessantes deste viajante compartilho com vocês.