Já faz um tempo que junto a uma querida aluna temos usado um belo texto para fomentar algumas ótimas reflexões. Este do qual vos falo é um manuscrito chamado yogāñjalisāram, escrito pelo grande professor Krishnamacharya, .

A pedido dela escrevo um pouco do que contemplamos juntos, para que possamos revisar e compartilhar. O verso de hoje foi o vinte e sete e diz o seguinte:

āsana torna o corpo leve
prāṇāyāma fortalece o prāna
dhāraṇā purifica o intelecto
Meditação purifica a mente.

KRISHNAMACHARYA, ŚLOKA 27 DO YOGĀÑJALISĀRAM

Quando falamos em āsana não devemos pensar apenas em posturas exóticas feitas sem critério. Para que seja considerado āsana, a postura precisa respeitar uma estrutura de conhecimento e técnicas que embasam uma prática correta, eficiente e benéfica. As posturas do yoga são feitas de forma integrada com a respiração e uma atitude mental adequada, elas são ordenadas e escolhidas inteligentemente e adaptadas as necessidades do praticante para que então promovam saúde e principalmente qualidade respiratória e mental.

A prática de āsana promove leveza ao corpo, mas não no sentido de reduzir números na balança. Ela remove gradualmente padrões negativos presentes no corpo, como as tensões do cotidiano, as más posturas, entre outros. E constrói novas marcas saudáveis em nosso veículo físico; de firmeza, relaxamento, mobilidade, etc. A prática correta também é muito eficaz na redução da agitação mental. Enquanto acompanhamos o corpo através da concentração na postura e na respiração, as chamas descontroladas do pensamento começam a apaziguar. Dessa forma somos levados a uma experiência de mais conforto e firmeza com relação ao nosso corpo; uma percepção de leveza agradável.

prāna entendemos como algo que flui continuamente de algum lugar dentro de nós, nos preenchendo e nos mantendo vivos; podemos traduzir como vitalidade. Em meio a tantas distrações, estresses, desgastes e outras perturbações do cotidiano essa energia vital se esvai e então experienciamos uma falta de vigor, de motivação e podemos nos sentir muito presos ou limitados. A falta de vida dentro da gente impede o movimento próspero e salutar e também abre portas para as doenças se desenvolverem. A prática correta de prāṇāyāmas, que são mais sutis que os āsanas, são as técnicas respiratórias do yoga. Quando designadas adequadamente e levadas a prática, elas promovem o resguardo dessa força vital, protegendo-a dentro do corpo, a fortalecendo e colocando-a novamente em seu movimento fisiológico natural e benéfico. Assim as ‘’águas da vida’’ voltam a correr dentro dos leitos originais e nos tornamos mais vivos e saudáveis. Dessa forma o terreno da mente faz-se ainda mais fértil para lidar melhor com as dificuldades da vida e colher maturidade e sabedoria para o nosso caminho.

Dhāraṇā de alguma forma é aquilo que todos já perceberam na mente em algum nível, quando tentamos passar um fio pelo buraco de uma agulha, quando miramos uma bola de papel em um lixo distante para encestar, também quando determinados pintamos algo tentando não manchar o que está do lado, ou ainda quando mantemos uma atenção direcionada para entender uma leitura ou explicação. Dhāraṇā é a concentração, que no yoga é treinada de uma forma bem estruturada e escolhida. A prática já começa a ser desenvolvida junto as posturas, onde mantemos uma atenção direcionada ao corpo, a respiração ou a algum elemento específico nos āsanas. Ela se sutiliza mais nos prāṇāyāmas, aprofundando-se. E pode haver um momento ainda mais sensível para praticar apenas o direcionamento da atenção, em algum objeto, técnica ou verso elegido. O ato de concentrar-se é capaz de remover resíduos mentais negativos, que são como lixos acumulados dentro da gente, num lugar invisível, cargas emocionais ou intelectuais nocivas. Ao longo do dia, devido ao nossos enganos naturais, maus hábitos e etc, a esfera mais superficial da mente, esta responsável pela atenção, aqui chamada de intelecto, acumula padrões maléficos. Esses padrões tendem a se repetir gerando mais e mais experiências de distrações e sujeiras acumuladas. Quando treinamos a atenção, começamos a limpar esses resíduos aglomerados e a desenvolver o intelecto em melhor direção. Por isso dhāraṇā purifica a esfera mental da atenção.

A meditação já é algo mais profundo, no yoga, ela prevê o relacionamento sensível com algo que nos nutrirá positivamente, favorecendo nosso caminho de autoconhecimento amplamente. Nossa mente, normalmente acaba sendo senhora das nossas ações, a partir de inconsciência. Ela está permeada de escuridão e assim agimos por parte de nossos enganos, medos, reações negativas e por aí vai. Quando meditamos buscamos compreensão, sabedoria, maturidade. Procuramos iluminar a nossa mente para que ela sirva de ferramenta à consciência. Quando meditamos então tornamo-nos mais lúcidos de nossos obstáculos internos, assim podendo reduzi-los. E fortalecemos a luz da sabedoria para que nossas ações sejam mais conscientes e benéficas. Dessa maneira purificamos nossa mente.

Esse verso fala sobre a prática formal do yoga e descreve sucintamente seus benefícios.